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- 2º Grau
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Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2020.0000937869
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1007134-88.2019.8.26.0004, da Comarca de São Paulo, em que é apelante/apelado CARLOS FERREIRA, é apelada/apelante MARISA SPAKAUSKAS.
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram parcial provimento ao recurso do autor e negaram provimento ao recurso da ré. V.U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores WALTER EXNER (Presidente sem voto), JAYME QUEIROZ LOPES E ARANTES THEODORO.
São Paulo, 17 de novembro de 2020.
MILTON CARVALHO
Relator
Assinatura Eletrônica
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Voto nº 28006.
Apelação nº 1007134-88.2019.8.26.0004.
Comarca: São Paulo.
Apelantes e reciprocamente apelados: Carlos Ferreira e Marisa
Spakauskas.
Juiz prolator da sentença: Sidney Tadeu Cardeal Banti.
AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Autor contratado para propor reclamação trabalhista em nome da ré. Mandato revogado antes da conclusão do processo. Pretensão de redução do valor fixado na sentença que não pode ser acolhida. Remuneração do patrono que deve ser compatível com o trabalho desenvolvido e com o valor econômico envolvido na causa. Honorários previstos no contrato que seriam de 30% do valor recebido. Aplicação do disposto no art. 22, § 3º, da Lei 8.906/94, para considerar que 2/3 dos honorários totais seriam devidos até a sentença. Atuação do autor que correspondeu a 70% do trabalho desenvolvido até a prolação da sentença na reclamação trabalhista. Pedido de arbitramento de honorários advocatícios de forma proporcional ao trabalho realizado na reclamação trabalhista que foi integralmente acolhido. Decaimento exclusivo da ré. Recurso da ré desprovido, provido em parte o do autor.
Trata-se de pedido de arbitramento e cobrança de
honorários advocatícios, julgado parcialmente procedente pela respeitável
sentença de fls. 431/434, integrada pela decisão de fls. 442, cujo relatório se
adota, para condenar a ré a pagar ao autor a quantia de R$50.000,00,
corrigida monetariamente a partir do vencimento e acrescida de juros de
mora desde a citação, tornando efetiva a tutela concedida e determinando a
liberação dos valores remanescentes após o trânsito em julgado, bem como
condenando a ré a arcar com a parte das custas que sucumbiu, metade dos
honorários periciais e honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o
valor da condenação, e o autor a arcar com a parte das custas que
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sucumbiu, metade dos honorários periciais e honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o proveito econômico obtido pela ré.
Inconformadas, apelam as partes.
O autor , sustentando que, conforme apurado pela perícia, a contraprestação que lhe é devida pelos serviços advocatícios prestados à ré corresponde a R$130.091,57; que tal apuração foi feita sem levar em consideração as horas trabalhadas antes da formalização do contrato entre as partes e com base no valor de R$785.969,93, embora o proveito econômico bruto alcançado na reclamação trabalhista fosse de R$862.727,91 em 20/12/2019; e que a ré deve ser responsabilizada pelo pagamento integral das verbas sucumbenciais (fls. 445/458).
E a ré , aduzindo que a verba honorária no valor de R$50.000,00 somente seria justificaria se o autor tivesse desempenhado integralmente seu trabalho na reclamação trabalhista; que a perícia estimou que os honorários devidos seriam de R$28.580,64; que um dos pedidos formulados na reclamação trabalhista foi julgado improcedente em razão da desídia do autor, gerando para ela um prejuízo de R$21.120,00; que de acordo com a tabela da OAB o autor deveria receber a quantia de R$1.190,85; e que deve prevalecer a proposta feita pelo autor quanto ao recebimento da importância correspondente a quatro salários mínimos (fls. 461/465).
Houve respostas (fls. 469/473 e 474/475).
Em atenção à certidão de fls. 479, o autor complementou o recolhimento do preparo recursal (fls. 482/484).
E, diante da determinação de fls. 485/487, a ré comprovou o recolhimento do preparo em dobro (fls. 490/493).
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É o essencial a ser relatado.
O apelo da ré não é de ser provido, ao passo que o do autor comporta parcial provimento.
Narra a petição inicial que o autor foi contratado pela ré para o ajuizamento de reclamação trabalhista em face de Fox Film do Brasil S/A e, em contrapartida, ela se obrigou ao pagamento de honorários advocatícios correspondentes a 30% do valor bruto que viesse a receber, no entanto, apesar da regular prestação dos serviços e de toda a dedicação empregada no trabalho, a ré, sem qualquer justificativa, revogou o mandato outorgado e lhe ofereceu em pagamento o valor de um salário mínimo pelos serviços já prestados. O autor pediu, assim, o arbitramento dos honorários que lhe são devidos e a condenação da ré ao seu pagamento.
Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes para fixar os honorários contratuais devidos ao autor em R$50.000,00, corrigido monetariamente e acrescido de juros de mora.
A celebração do contrato de prestação de serviços advocatícios entre partes, por meio do qual a ré se obrigou ao pagamento de honorários correspondentes a 30% dos valores que viesse a receber na reclamação trabalhista promovida em face de Fox Film do Brasil, não só restou incontroversa como foi amplamente comprovada. O mesmo se verificou com relação ao fato de que a prestação de serviços se encerrou
No recurso interposto, a ré não nega a obrigação de pagar honorários advocatícios em favor do autor, apenas pretende a redução do valor arbitrado pelo Magistrado a quo. Por sua vez, o autor impugna a sentença objetivando a majoração da verba honorária arbitrada.
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Ambas as partes fundamentam seus pedidos de reforma da sentença nas conclusões lançadas no laudo pericial, uma vez que o perito judicial estimou dois valores distintos (R$28.580,64 e R$130.091,57), a partir da adoção de critérios diferentes (fls. 286).
Com efeito, os cálculos elaborados pelo perito levaram em consideração uma estimativa de horas trabalhadas pelo autor, cujos valores foram calculados (a) a partir do valor da hora intelectual previsto na tabela de honorários da OAB, e (b) levando em consideração o valor total dos honorários advocatícios estabelecidos no contrato havido entre as partes e o critério de que 2/3 do total seria devido até a sentença.
O cálculo feito com o valor da hora intelectual previsto na tabela de honorários da OAB não pode ser prestigiado no caso em apreço, considerando-se que o contrato celebrado entre as partes em momento algum vinculou a remuneração do profissional à referida tabela (fls. 09).
Ressalte-se que não existe obrigatoriedade de que a verba honorária seja fixada com base em tal tabela, que prevê apenas a remuneração mínima devida ao advogado. Aliás, acerca da situação de fixação dos honorários advocatícios por arbitramento judicial, o artigo 22, § 2º, da Lei 8.906/94 dispõe expressamente que a remuneração deve ser compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, não podendo ser inferiores aos estabelecidos na tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB.
Diante do valor econômico envolvido na reclamação trabalhista promovida em nome da ré (que em dezembro de 2019 superava a quantia de R$860.000,00), resta evidente que a fixação da contraprestação financeira devida ao autor pelos serviços advocatícios prestados pelo valor da tabela (R$1.190,85) infringira a precitada norma.
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Por essa mesma razão também é descabida a pretensão da ré que de que os honorários advocatícios contratuais devidos ao autor fossem fixados em quatro salários mínimos. Ainda que tal quantia tenha sido sugerida em proposta de acordo havido entre as partes, na medida em que elas não chegaram a solução consensual e a questão foi submetida a apreciação judicial para fixação da verba honorária por arbitramento, é de rigor que se observe o disposto no artigo 22, § 2º, da Lei 8.906/94.
Anote-se, outrossim, que a alegação de que o autor, no desempenho de sua atividade profissional, gerou prejuízo para a ré na ordem de R$21.120,00 não foi alegada em contestação (fls. 37/46) e, por constitui inovação recursal, não pode ser conhecida.
Além disso, não há como se compreender que o arbitramento de honorários em favor do autor acarreta prejuízo para a ré, tendo em vista que a verba honorária constitui contraprestação pelos serviços advocatícios prestados em seu benefício e que resultaram na condenação de sua antiga empregadora na reclamação trabalhista (processo nº 0000757-97.2014.8.26.0203).
De outro lado, assiste razão ao autor quanto à necessidade de majoração da verba honorária fixada, embora não para o importe de R$130.091,57 estimado pelo perito judicial.
Como já pontuado, o § 2º do artigo 22 da Lei 8.906/94 determina que, no caso de arbitramento judicial, os honorários advocatícios devem ser fixados em valor compatível com o trabalho desenvolvido.
E a jurisprudência tem entendido ser razoável que o arbitramento se faça com base no disposto no § 3º do mesmo dispositivo legal, que prevê: Salvo estipulação em contrário, um terço dos honorários é devido no início do serviço, outro terço até a decisão de primeira instância e
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o restante no final.
O perito judicial valeu-se de aludida norma para concluir que, a partir da estimativa de que foram despendidas 58 horas de trabalho por advogados até a prolação da sentença na reclamação trabalhista (das quais 48 couberam ao autor e 10 ao novo patrono constituído pela ré), a remuneração devida ao autor seria de R$130.091,57.
De fato, conforme explicitado no laudo, o perito considerou que 2/3 do total dos honorários advocatícios pactuados entre as partes (30% do quanto viesse a ser recebido pela ré na reclamação trabalhista) corresponderiam à remuneração devida pelos serviços prestados até a prolação da sentença (ou seja, R$157.193,99). Assim, porquanto estimou que até a sentença os advogados que atuaram no processo trabalhista despenderam 58 horas de trabalho, sendo que 48 delas couberam ao autor, ele faria jus a honorários na ordem de R$130.091,57.
Todavia, ainda que o número de horas atribuídas a cada um dos patronos não tenha sido impugnado especificamente por qualquer das partes (pelo qual o autor deveria receber 82,75% dos honorários devidos até a sentença), este não pode ser o único critério a ser observado no arbitramento de sua remuneração.
Com efeito, apesar de o perito não ter se manifestado sobre a qualidade do trabalho desenvolvido pelo autor em benefício da ré, por entender que esta seria questão de mérito a ser apreciada pelo juiz, ficou expresso no laudo que a petição inicial da reclamação trabalhista não foi instruída com toda a documentação necessária à comprovação dos fatos narrados pela reclamante (fls. 278).
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As correspondências eletrônicas juntadas com a petição inicial também revelam que a revogação do mandato outorgado ao autor se justificou em consequência da insatisfação da ré quanto aos serviços prestados. Além disso, em contestação a ré afirmou que o autor deixou de cientificá-la acerca da necessidade de comparecimento na perícia, o que não foi negado em réplica.
Nesse contexto, afigura-se mais adequada a fixação dos honorários advocatícios devidos ao autor pelos serviços prestados na reclamação trabalhista nº 0000757-97.2014.8.26.0203 em 70% dos honorários devidos até a prolação da sentença naquele feito, o que corresponde a R$110.035,79.
Não tendo o autor impugnado os termos iniciais da correção monetária e dos juros de mora fixados na sentença, embora majorado o valor dos honorários advocatícios, estes se mantêm inalterados.
No tocante as verbas sucumbenciais a respeitável sentença recorrida também comporta reparo.
Isso porque, na petição inicial, o autor não especificou o valor da verba honorária que considerava devida e pediu o arbitramento definitivo do percentual dos honorários advocatícios pelos serviços prestados até a data da revogação do respectivo mandato. Diante disso, como o Magistrado a quo entendeu que a remuneração proporcional ao trabalho desenvolvido pelo autor era de R$50.000,00, houve integral acolhimento da pretensão formulada, o que significa que ele não decaiu em qualquer parcela do seu pedido e que, independentemente da majoração do valor da condenação nesta fase recursal, caberia à ré responder pelo pagamento integral das verbas sucumbenciais.
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Assim, fica a ré condenada a arcar com o pagamento da integralidade das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios, ora arbitrados em 12% sobre o valor da condenação, já considerado o trabalho adicional desempenhado nesta fase recursal.
Por fim, não obstante o acolhimento do recurso do autor e o desprovimento do da ré, não há fundamento para a condenação dela por litigância de má-fé. É que, conforme orientação jurisprudencial adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, a condenação por litigância de má-fé exige prova do dolo ( EDcl no Ag 691.061/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 06.11.2012; AgRg no AgRg no Ag 1.238.201/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 20.03.2012 ), e, no caso em exame, não se evidenciou a prática de conduta temerária pela ré, mas o mero exercício do direito de defesa, sem qualquer abuso.
Por tais fundamentos, dá-se parcial provimento ao recurso do autor, e nega-se provimento ao da ré.
MILTON PAULO DE CARVALHO FILHO
relator