Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Apelação Cível: AC XXXXX-47.2019.8.26.0002 SP XXXXX-47.2019.8.26.0002 - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
há 3 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

5ª Câmara de Direito Privado

Publicação

Julgamento

Relator

J.L. Mônaco da Silva

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-SP_AC_10630354720198260002_62a5f.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro : 2021.0000000878

Apelação Cível n. XXXXX-47.2019.8.26.0002

Voto n. 35276

Vistos, etc.

Nego seguimento ao recurso.

Registro que a presente decisão monocrática tem respaldo no art. 168, § 3º, c.c. o art. 252 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo.

De início, a preliminar suscitada pela ré nas contrarrazões não comporta acolhimento. Com efeito, o autor impugnou os fundamentos da sentença, ainda que tenha reproduzido as teses arguidas na petição inicial. Ou seja, atacou a decisão, notadamente ao afirmar a possibilidade da rescisão imotivada com base no contrato. Sendo assim, a apelação observou o art. 1.010, inc. III, do Código de Processo Civil, não sendo possível falar em ofensa ao princípio da dialeticidade.

No mérito, é caso de ratificar os fundamentos da r. sentença apelada, proferida nos seguintes termos:

“JOSÉ PIRES DE OLIVEIRA move ação de obrigação de fazer c/pedido de antecipação de tutela contra UNIMED CAMPINAS COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO alegando, em resumo, que: a) é beneficiário de plano de saúde junto à requerida na modalidade coletivo por adesão, sendo sua esposa dependente no plano; b) em 13/08/2019, em retaliação

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

às ações propostas em face da ré discutindo o reajuste de mensalidades, a ré informou a exclusão da dependente do autor do plano de saúde a partir de 10/10/2019; c) em resposta à reclamação formulada, a ré informou que a exclusão, em verdade, deve-se à extinção do contrato de seguro saúde mantido com a AEDERESP, facultada a portabilidade, conforme comunicado encaminhado; d) não recebeu tal comunicado; e) a resilição imotivada do contrato é abusiva, mormente porque o autor e sua dependente têm mais de 80 (oitenta) anos e eles padecem de graves problemas de saúde; f) os planos de saúde disponibilizados pela ré apresentam condições excessivamente onerosas.

(...)

No mérito, a ação é procedente.

Trata-se de ação de obrigação de fazer de manutenção da plano de saúde, calcada no fato de que a requerida rescindiu unilateralmente o plano de saúde coletivo do qual o autor e sua dependente são beneficiários, vigente desde meados de 1992, vinculado à Associação dos Engenheiros do D.E.R. do Estado de São Paulo (AEDERESP).

É incontroverso nos autos o vínculo entre as partes, restando a controvérsia acerca da regularidade ou não da rescisão unilateral pela requerida.

Imperioso destacar, de início, que no caso incidem as normas do Código de Defesa do Consumidor, pois a qualidade de consumidor resulta da prestação de serviços de saúde, mediante o pagamento de mensalidade.

É fato notório que, embora notificado previamente acerca da exclusão da beneficiária Maria Djanira do plano de saúde (fls. 98), não foi ofertada ao requerente outra apólice, tampouco foi fornecida justificativa plausível para o cancelamento da apólice que vinha sendo paga sem atrasos (fls. 76).

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Assim, a controvérsia cinge-se em aferir a legitimidade da rescisão contratual unilateral imotivada, bem como na legalidade da cláusula que estipula essa possibilidade, mesmo estando os contratantes em pleno tratamento de saúde.

É cediço que a precariedade do sistema de saúde pública do país serviu de estímulo à criação e ampliação de planos de saúde particulares, de modo que o consumidor, necessitando de atendimento médico, principalmente em situações emergenciais ou mesmo enfermidades graves, vê-se obrigado a aderir aos referidos planos que, por diversas vezes, contém cláusulas abusivas.

Assim, para aferir eventual abusividade da referida cláusula, é preciso analisar o contrato de plano de saúde levando em conta que o seu objetivo é assegurar o direito à saúde e à vida. Sendo assim, é evidente que a cláusula questionada pela autora na inicial é excessivamente limitativa do direito do consumidor, implicando em evidente desequilíbrio do contrato em prejuízo do hipossuficiente, na medida em que coloca o consumidor em desvantagem exagerada perante a empresa ré.

Destaque-se, demais, que os beneficiários estão em idade avançada, de modo que não podem ficar sem a devida assistência de saúde.

Com efeito, é sabido que o consumidor deste tipo de serviço vai necessitar utilizá-lo com mais frequência conforme for ficando mais velho, aumentando as despesas para o plano de saúde e encontra dificuldades em migrar para outro plano em virtude da carência e das mensalidades que aumentam proporcionalmente a sua idade.

Sendo assim, a fornecedora utiliza desta possibilidade de rescisão quando as despesas aumentam, seja pela idade ou por excessiva utilização do plano, como é o caso dos autos, depois de anos

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

usufruindo das mensalidades com pouca contraprestação, opta por rescindir o contrato, ferindo o equilíbrio contratual de forma brutal.

Entendimento contrário implicaria, de certo, em grave violação do disposto no artigo 51, incisos IV e XI do Código de Defesa do Consumidor e artigo 13, III, da Lei nº 9.656/98, respectivamente, in verbis: “Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação. (...) III - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, em qualquer hipótese, durante a ocorrência de internação do titular”.

Sendo assim, a cláusula contratual que permite o cancelamento unilateral imotivado fere a função social do contrato de seguro saúde, sendo de fato incompatível com princípios da dignidade da pessoa humana, da boa-fé, da equidade e com os princípios consumeristas, sendo a conduta vedada pelo artigo 13, parágrafo único, da Lei 9.656/98, nos termos já fundamentados.

Vale acrescentar que a manutenção do contrato, obviamente mediante o pagamento das faturas mensais, não implicará prejuízo à operadora ré em consideração dos riscos normais inerentes àquilo que se propõe nos planos de saúde.

(...)

De se notar, ainda, que a ré não demonstrou que disponibilizou plano individual ou familiar equivalente àquele contratado, nos termos do artigo 1º da Resolução CONSU nº 19, de 25 de março de 1999, que assim dispõe:

"As operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adesão para empresas que concedem esse benefício a seus empregados, ou

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

exempregados, deverão disponibilizar plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficiários, no caso de cancelamento desse benefício, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência".

Assim, não existe fundamento para a rescisão unilateral, em detrimento dos beneficiários do plano em questão, independentemente de cláusula contratual a prevendo, pois é necessário ponderar que se trata de relação consumerista, na qual devem ser nulas as cláusulas abusivas ao consumidor, conforme disposto no art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor.

Nesse contexto, a procedência da demanda é medida que se impõe.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para: a) decretar nulas as cláusulas contratuais que permitem a rescisão unilateral imotivada pela ré; b) confirmando a antecipação de tutela concedida, compelir a ré a manter o autor e sua dependente como beneficiários do plano de saúde, nas mesmas condições do contrato anteriormente celebrado com a estipulante, com as mesmas coberturas e valor da mensalidade, por tempo indeterminado, desde que adimplidos pelos usuários a integralidade do valor do prêmio, admitidos os reajustes nos termos do contrato e regulamentação da ANS.

Vencida a ré, arcará com o pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% do valor da causa” (v. fls. 286/289).

Em que pese o sustentado nas razões recursais, a apelante não comprovou o encaminhamento de nenhum documento ao apelado a fim de lhe garantir o direito à portabilidade do plano de saúde contratado, sem carências, uma vez que o documento de fls. 98 diz respeito apenas a Maria

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Djanira Pereira de Oliveira, sua dependente. Ora, considerando a avançada idade do apelado e de sua cônjuge, 84 e 81 anos (v. fls. 17 e 112) e, ainda, o fim social do contrato em discussão e a boa-fé objetiva dos contratantes, não pode prevalecer a rescisão unilateral em desfavor dos beneficiários, considerando que já arcam com o pagamento das mensalidades de forma direta em razão da procedência do pedido objeto do processo n. XXXXX-84.2014.8.26.0002 envolvendo o mesmo contrato (v. fls. 64/75), fato não impugnado pela recorrente.

As demais teses recursais foram suficientemente enfrentadas pelos fundamentos da r. sentença, sendo desnecessárias mais considerações.

Cabe a majoração dos honorários advocatícios de 10% (dez por cento) para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, considerando o trabalho adicional realizado em grau recursal, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil.

Em suma, a r. sentença não merece nenhum reparo.

Por fim, uma advertência: o recurso interposto contra esta decisão poderá ficar sujeito a multa.

Posto isso, nego seguimento ao recurso.

Int.

São Paulo, 7 de janeiro de 2021

J.L. MÔNACO DA SILVA

Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-sp/1151244198/inteiro-teor-1151244236