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- 2º Grau
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Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial
Registro: 2021.0000766765
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2062845-05.2021.8.26.0000, da Comarca de Sorocaba, em que são agravantes LUANA PIACITELLI CAMARGO, ANDERSON GOMES CAMARGO e CERVEJARIA SOROCABANA LTDA., é agravado CARLOS ABNER MARQUES.
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores CESAR CIAMPOLINI (Presidente sem voto), AZUMA NISHI E FORTES BARBOSA.
São Paulo, 21 de setembro de 2021.
ALEXANDRE LAZZARINI
Relator
Assinatura Eletrônica
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1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial
Voto nº 26433
Agravo de Instrumento nº 2062845-05.2021.8.26.0000
Comarca: Sorocaba (2ª. Vara Cível)
Juiz (a): Alessandra Lopes Santana de Mello
Agravantes: Luana Piacitelli Camargo, Anderson Gomes Camargo e Cervejaria Sorocabana Ltda.
Agravado: Carlos Abner Marques
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. TUTELA ANTECIPADA. AFASTAMENTO DO ADMINISTRADOR. MATÉRIA NÃO DISCUTIDA NA R. DECISÃO. SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES. MEDIDA DRÁSTICA. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL PARA MAIORES ELEMENTOS SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE CADA SÓCIO. DIREITO DE RETIRADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Trata-se de agravo de instrumento interposto por Luana Piacitelli
Camargo, Anderson Gomes Camargo e 'Cervejaria Sorocabana Ltda' contra a r. decisão
copiada às pp. 14/15 (fls. 326/327 dos originais), que, nos autos da “ação de dissolução
total de sociedade empresarial limitada e liquidação com pedido liminar de suspensão de
atividade operacional” movida por Carlos Abner Marques, deferiu em parte a liminar
pleiteada, nos seguintes termos:
“Vistos.
Fls:284/ss: Recebo como emenda à inicial. Anote-se.
Trata-se de ação de dissolução total de sociedade empresária, em que o autor pleiteia, liminarmente, a suspensão das atividades operacionais da empresa ré, autorização à retirada de bens adquiridos em nome próprio e que se encontram nas dependências da ré e autorização à retirada de bens em geral, a fim de reduzir os custos de manutenção.
Os pedidos liminares comportam parcial deferimento , com fulcro no art. 300 e seguintes do CPC.
Conquanto seja o autor sócio majoritário da empresa ré, não convém determinar a suspensão de todas as suas atividades antes de realizar o prévio contraditório.
A teor da Cláusula 6ª do contrato social da empresa ré, os poderes de administração da empresa foram conferidos exclusivamente ao autor, único que pode assinar documentos em nome da empresa (fl. 34).
Verifico, ainda, ter sido concedida medida liminar de reintegração de posse ao autor, nos autos do Processo nº 1040213-73.2020, em curso perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Sorocaba, garantindo-lhe o direito de entrar e utilizar o imóvel em que fora instalada a empresa ré.
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Tais medidas parecem suficientes, ao menos a priori, para resguardar os interesses de terceiros e do autor.
Afigura-se inviável permitir ao autor remover os bens da empresa para local distinto, ainda que sob sua guarda, à medida que isso poderia frustrar o cumprimento de obrigações assumidas pela pessoa jurídica ré em face de terceiros ou paralisaria suas atividades.
Pelas mesmas razões, não convém permitir que o autor retire bens adquiridos em nome próprio, conforme Notas Fiscais apresentadas, considerando serem estes claramente insumos necessários ao exercício da atividade empresarial, como se vê no documento de fl. 98, não se tratando de bens de natureza pessoal.
Observa-se que a maior parte das Notas Fiscais já foram emitidas em nome da empresa, pelo que não se antevê, nesse momento, maior prejuízo ao autor.
Por outro lado, considerando ser o autor titular de 95% das cotas sociais e demonstrar interesse em desfazer a sociedade, o que encontra respaldo, ao menos em princípio, no art. 1033, inc. III, do Código Civil, imponho aos réus o dever de se absterem de realizar novos negócios em nome da pessoa jurídica, a partir de sua citação, ficando impedidos de contrair novos direitos e obrigações para a empresa ré.
Deverão apenas dar continuidade e cumprimento às obrigações previamente assumidas, desincumbindo-se dos contratos e obrigações já contraídas, a fim de evitar prejuízos a terceiros e também à empresa ré.
Em caso de descumprimento da presente medida liminar, poderão os réus, pessoas físicas, responder pessoalmente pelos ônus financeiros de suas práticas, sem prejuízo da adoção de outras medidas de apoio a serem fixadas pelo juízo.
No mais, cite-se e intimem-se os réus, com urgência, a fim de que, em o querendo, ofereçam contestações no prazo de 15 dias, sob pena de revelia. Serve a presente como mandado de citação, para todos os fins.
Int.”
Insurgem-se os agravantes, sustentando, em síntese, que: a) a r.
decisão coloca em risco a continuidade dos negócios e da própria empresa; b) os únicos
fundamentos para concessão da liminar foram o interesse do agravado na dissolução da
sociedade e sua participação no capital social (95% das cotas); c) apesar do que consta no
contrato social, a sociedade sempre foi, de fato, dividida em 50% para cada parte; d) o
agravado exerceu seu direito de retirada, assumindo os agravantes a totalidade dos
encargos e negócios da empresa, ou seja, desde o final de 2020, o agravado não pertence
mais à sociedade; e) a quebra da affectio societatis não implica na extinção da empresa; e f)
deve ser reconhecido o afastamento do agravado da administração, para que as atividades
sejam exercidas normalmente, tendo em vista que apenas ele representa a empresa
conforme consta no contrato social.
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Contraminuta às pp. 550/560.
Não houve oposição ao julgamento virtual.
É o relatório.
I) A presente ação de dissolução total de sociedade foi ajuizada em 27/01/2021, após negociação infrutífera para dissolução parcial amigável e pagamento dos haveres do autor.
Pleiteia liminarmente (a) a suspensão das atividades operacionais da sociedade empresária, bem como a autorização para retirada dos bens e sua respectiva guarda em local apropriado a fim de reduzir os custos e manutenção dos bens a serem liquidados; e (b) a retirada dos bens que lhe pertencem enquanto pessoa física, uma vez que foram comprados, faturados contra pessoa do Autor e pagos com dinheiro pessoal do Autor não guardando relação com a empresa, mas que contudo, estão nas dependências da empresa.
O autor pretende a dissolução total da sociedade e sua nomeação como liquidante. Subsidiariamente, requer a dissolução parcial e o pagamento dos haveres, bem como a limitação de sua responsabilidade à distribuição do Processo nº 1040213-73.2020.8.26.0602, quando deixou de ter acesso à empresa.
II) Em que pese o entendimento do MM Juízo, o recurso deve ser parcialmente provido.
Por primeiro, conforme já mencionado quando do deferimento do efeito suspensivo, “o afastamento do administrador não é objeto da r. decisão, inexistindo apreciação do MM Juízo sobre a matéria”, razão pela qual não será a questão debatida no presente recurso.
Quanto à suspensão das atividades da empresa, anote-se que os agravantes pretendem continuar com a produção de cervejas, como ficou demonstrado pelas notificações e e-mails trocados entre as partes (fls. 425/467 dos originais).
O que se depreende, por ora, é que o agravado exerceu seu direito de retirada (novembro de 2020), inexistindo, todavia, acordo em relação ao preço a ser pago pelas suas cotas, situação que poderia ter sido resolvida por meio de balanço especial para apuração de haveres.
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Sobre a matéria, interessante transcrever lição de Fabio Ulhoa
Coelho (Curso de Direito Comercial Direito de Empresa, vol. 2, 21ª ed, Revista dos
Tribunais, São Paulo, 2018, pp.416-418):
“O sócio que não deseja mais participar da sociedade tem, à sua frente, duas alternativas. A primeira é a negociação de suas quotas. Seguindo por essa via, ele deve procurar, entre os sócios ou junto a terceiros, alguém interessado em adquirir-lhe a participação societária. (...) A segunda alternativa para o sócio que não quer mais integrar a sociedade limitada é a retirada. (...) Define-se retirada como o direito de o sócio se desligar dos vínculos que o unem aos demais sócios e à sociedade, por ato unilateral de vontade. Nessa hipótese, não há negociação. O sócio impõe à pessoa jurídica, por sua exclusiva vontade, a obrigação de lhe reembolsar o valor da participação societária.
(...)
Pelos princípios gerais do direito dos contratos, a resposta pertinente indica que a exteriorização da vontade do sócio, no sentido de se retirar da sociedade, é já suficiente para operar o desligamento, porque não está o ato sujeito a qualquer outra condição. A definição do momento a ser reembolsado é decorrência do fim do vínculo contratual, e, portanto, o pressupõe. Assim, no momento em que a sociedade recebe a declaração escrita do sócio de que está exercendo o seu direito de recesso, desfazemse os vínculos societários que o envolviam.”
Importante mencionar que sequer a participação de cada sócio está
esclarecida, embora conste no contrato social ser o agravado detentor de 95% das cotas
sociais, mostrando-se prudente aguardar-se a instrução processual
Não se pode deixar de mencionar que o encerramento das
atividades é medida drástica, especialmente em um setor tão afetado pela pandemia,
podendo tornar-se irreversível.
Portanto, a r. sentença deve ser modificada, a fim de permitir a
continuidade das atividades da Cervejaria Sorocabana.
Diante do exposto, dá-se parcial provimento ao agravo de
instrumento.
ALEXANDRE LAZZARINI
Relator
(assinatura eletrônica)