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- 2º Grau
Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Remessa Necessária Cível: 1000395-56.2021.8.26.0125 SP 1000395-56.2021.8.26.0125 - Inteiro Teor
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Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
VICE-PRESIDÊNCIA
Registro: 2021.0000859827
DECISÃO MONOCRÁTICA
REEXAME NECESSÁRIO nº 1000395-56.2021.8.26.0125
CÂMARA ESPECIAL
Relator: VICE-PRESIDENTE
Recorridos: Fazenda Pública do Estado de São Paulo e P. H. Z. C.
Comarca: Capivari
Magistrado: André Luiz Marcondes Pontes
V O T O Nº 58.742
REEXAME NECESSÁRIO. OBRIGAÇÃO DE FAZER.
EDUCAÇÃO. CRIANÇA PORTADORA DE
DEFICIÊNCIA VISUAL, AMAUROSE CONGÊNITA
DE LEBER E ATRASO DE APRENDIZADO.
PRETENSÃO DE DISPONIBILIZAÇÃO DE
PROFISSIONAL DE APOIO ESCOLAR. INTERESSE
PROCESSUAL PRESENTE. ATENDIMENTO
EDUCACIONAL ADEQUADO ÀS NECESSIDADES DO
MENOR. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 205, 208, III
E VII, E 227, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL,
ARTIGOS 53, I, 54, III E VII, §§ 1º E 2º E 208, II E V,
DO ECA, ARTIGO 59, I E III, DA LEI 9.394/96 E
ARTIGO 3º, XIII, DA LEI 13.146/2015.
1. No presente caso a menor é portador de deficiência
visual, amaurose congênita de Leber e atraso de
aprendizado, necessitando de profissional de apoio
escolar para frequentar o ambiente escolar.
2. Comprovadas as enfermidades apontadas nos
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documentos constantes nos autos, a Fazenda Pública deve
assegurar ao menor os meios necessários para
proporcionar as condições adequadas à sua saúde e
educação.
3. Para que não haja imposição de ônus excessivo ao
Poder Público em prejuízo ao interesse coletivo, a
determinação não obriga a Fazenda Pública a prover ao
autor profissional de apoio escolar exclusivo.
4. Possibilidade de imposição de multa contra o Poder
Público. artigos 536, § 1º, do C P C, e 213, caput e § 2º, do
ECA, no entanto, o valor fixado deve ser reduzido para R$
250,00 (duzentos e cinquenta reais).
5. Reexame necessário parcialmente provido.
1. Trata-se de reexame necessário da sentença
proferida pelo MM. Juiz André Luiz Marcondes Pontes (fls. 68/73) que,
em ação de obrigação de fazer, julgou procedente o pedido do autor
para condenar o Estado de São Paulo à obrigação de fazer,
consistente em disponibilizar professor auxiliar capacitado a dar
assistência contínua a P. H. Z. C., durante as aulas, sob pena de multa
diária de R$500,00 (quinhentos reais), devida a cada constatação do
descumprimento da sentença, limitada ao valor de R$10.000,00 (dez
mil reais).
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo
parcial provimento do recurso (fls. 87/92).
É o relatório.
2. De proêmio, diante da jurisprudência
sedimentada e da suficiência dos documentos que instruem os autos,
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passa-se desde logo ao julgamento, modo de garantir ao jurisdicionado
acesso pleno à ordem jurisdicional em tempo razoável, vetor
constitucional introduzido pela EC nº 45.
No presente caso, o menor, nascido em
09/03/2006 (fls. 11/12), é portador de deficiência visual (CID E75.4),
amaurose congênita de Leber (CID H35.5) e atraso de aprendizado,
necessitando de profissional de apoio escolar em sala de aula, em
acompanhamento para continuidade do seu aprendizado (fls. 14/15).
Com efeito, o princípio da proteção integral à
criança e ao adolescente, previsto no artigo 1º da Lei 8.069/90,
conjugado com os artigos 205, 208, incisos III e VII, e 227, II, da
Constituição Federal, os artigos 53, I, 54, incisos III e VII, parágrafos 1º
e 2º e 208, II e V, do Estatuto da Criança e do Adolescente, o artigo 59,
I e III, da Lei nº 9.394/96, impõem ao Estado, em seu sentido amplo, o
dever de assegurar o efetivo exercício dos direitos das crianças e
adolescentes, dentre os quais figura o atendimento educacional
especializado aos portadores de deficiência, inclusive, se necessário,
com a disponibilização de profissionais habilitados.
Nesse contexto, a Fazenda Pública deve
assegurar ao menor os meios necessários para proporcionar as
condições adequadas à sua saúde e educação, como forma de
minimizar as consequências de sua enfermidade, sem privá-lo, todavia,
da necessária integração e convívio social.
O entendimento aqui esposado não destoa dos
julgados desta Câmara Especial:
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“MANDADO DE SEGURANÇA Menor portador de
necessidades especiais - Impetração visando à concessão
de acompanhamento especializado na escola pública que
frequenta - Direito líquido e certo configurado - Observância
aos arts. 208 da CF, e 53 e 54 do ECA Sentença
concessiva da segurança mantida. Reexame necessário e
recurso voluntário da FESP improvidos.” (Apelação nº
0000669-07.2013.8.26.0452, 9ª Câmara de Direito Público,
relator Desembargador Carlos Eduardo Pachi, julgado em
19/3/2014)
“Ação civil pública Contratação de cuidador a todos os
educandos portadores de necessidades especiais do
município Omissão da Administração violadora de direito à
educação Garantia do cidadão e dever do Estado que
reclama a pronta inclusão educacional dos menores
Decisão que visa preservar a proteção integral de crianças e
adolescentes com necessidades especiais de acordo com o
artigo 208, III e 227, § 1º, II, da CF e Lei nº 7.853/89 Multa
diária em caso de descumprimento da obrigação
Cabimento Inteligência do artigo 461, § 5º do Código de
Processo Civil Recursos improvidos.” (AC nº
0002438-16.2012.8.26.0604, Câmara Especial, relator Juiz
Marcelo Gordo, julgado em 13.5.2013).
De outra parte, eventual insuficiência de verbas
ou restrições orçamentárias não pode servir de desculpa para o não
atendimento especializado dos que dele precisem.
A responsabilização do Poder Público pela oferta
de acesso irrestrito à educação está amparada na Súmula 65 da
Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo:
Não violam os princípios constitucionais da separação e
independência dos poderes, da isonomia, da
discricionariedade administrativa e da anualidade
orçamentária as decisões judiciais que determinam às
pessoas jurídicas da administração direta a disponibilização
de vagas em unidades educacionais ou o fornecimento de
medicamentos, insumos, suplementos e transporte a
crianças ou adolescentes.
Inegável, portanto, a obrigação do Poder Público
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de aparelhar-se adequadamente para garantir o padrão de qualidade
do ensino, nada lhe servindo de escusa para furtar-se ao cumprimento
do dever constitucional de oferecer atendimento educacional
especializado.
Repisando-se ao caso concreto, da análise dos
autos, não se discute a enfermidade que acomete o infante, que requer
acompanhamento constante, diário e capacitado.
Contudo, insta salientar, para que não haja
imposição de ônus excessivo ao Poder Público em prejuízo ao
interesse coletivo, que a determinação nestes autos não obriga a
Fazenda Pública a prover ao autor profissional de apoio escolar
exclusivo, remanescendo a possibilidade de que este possa também
atender outros alunos com necessidades especiais, desde que em
número suficiente a não causar prejuízo em sua atuação.
Por fim, a imposição de multa contra a Fazenda
Pública do Estado de São Paulo está de acordo com o disposto no
artigo 536, § 1º, do Código de Processo Civil, e com o artigo 213,
caput, e § 2º da Lei 8.069/90, e sua aplicação garante a efetividade da
decisão.
No entanto, o valor fixado pelo Juízo a quo
mostrou-se excessivo e, por isso, deve ser reduzido para R$ 250,00
(duzentos e cinquenta reais), montante este que se mostra suficiente
para estimular o cumprimento da determinação, sem onerar de modo
excessivo os cofres públicos, limitada ao valor de R$10.000,00 (dez mil
reais).
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3. Do exposto, dá-se parcial provimento ao
reexame necessário para reduzir o valor da multa diária para R$
250,00 (duzentos e cinquenta reais).
Intimem-se.
São Paulo, 21 de outubro de 2021
LUIS SOARES DE MELLO
Vice-Presidente
Relator