29 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Registro: 2022.0000373232
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1130488-32.2014.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante V. C. B., é apelada P. A. P..
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 6a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores COSTA NETTO (Presidente sem voto), CHRISTIANO JORGE E ANA MARIA BALDY.
São Paulo, 18 de maio de 2022.
ANA ZOMERRelatora
Assinatura Eletrônica
Apelação de nº: 1130488-32.2014.8.26.0100
Apelante: V. C. B.
Apelado: P. A. P.
Comarca: São Paulo Foro Central
Voto nº 337
APELAÇÃO. Ação anulatória de casamento. Sentença que reconheceu a nulidade do matrimônio celebrado entre as partes em território estrangeiro, posteriormente transcrito no Brasil. Irresignação. Preliminar de incompetência da justiça nacional. Desacolhimento. Transcrição do casamento levada ao RCPN e de Interdições e Tutelas do 1º Subdistrito Sé. Artigo 32, § 1º, da Lei de nº 6.015/1973. Casamento que surte seus regulares e jurídicos efeitos no Brasil. Existência de Registro Civil do apelante. Inteligência dos artigos 21 e 23, inciso III, do Código de Processo Civil. Preliminar afastada. Mérito. Apelante que já era casado no momento do segundo casamento. Impedimento absoluto, artigos 1521, inciso VI e 1548, inciso II, do CC. Impossibilidade de contrair novas núpcias por violação a norma de ordem pública. Sentença mantida pelos próprios e jurídicos fundamentos. Adoção do artigo 252 do Regimento Interno deste TJSP. Recurso desprovido.
Vistos.
Trata-se de apelação tirada da r. sentença de fls. 600/602, que julgou procedente o pleito formulado em ação anulatória de casamento, declarando a nulidade do matrimônio celebrado entre as partes.
Sustenta em suas razões preliminarmente que, conforme relatado pela apelada, o casamento não poderia ter sido registrado no Brasil, apresentando documentação; ao depois, assevera que o procedimento de transcrição do casamento junto ao Registro Brasileiro ocorreu de maneira irregular, não detendo a justiça brasileira competência para o julgamento da causa, mas, sim, o local onde as partes estabeleceram sua residência, qual seja, a cidade de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, nos termos do artigo 7º, § 3º, da LICC, devendo o processo ser extinto sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, inciso IV, do CPC. No mérito, aduz que a apelada tinha conhecimento que o apelante estava aguardando a formalização de seu divórcio junto ao Registro Civil na cidade de Uberlândia em Minas Gerais, pois sabia que o recorrente estava separado de fato há muitos anos, não havendo assim, coação ou omissão dos fatos, violação aos Princípios da vedação aos comportamentos contraditórios ( venire contra factum proprium ) e da teoria da expectativa legítima, pugnando ao final, pela reforma da sententia.
Recurso tempestivo e preparado.
Contrarrazões pelo desprovimento do recurso e envio de ofício à D. PGJ para apuração do crime de bigamia, previsto no artigo 235, do Código Penal (fls. 621/643).
Termo de Sucessão de Relatoria nas fls. 651.
Memoriais pelo apelante, reiterando os termos de suas razões de apelo, manifestando-se pela não oposição ao julgamento virtual (666/670).
É o relatório.
Fundamento e decido.
O r. decisum afrontado merece ser confirmado por seus próprios e jurídicos fundamentos, nesta sede adotados como razão de decidir, nos termos do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça "Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver de mantê-la".
Pinçado dispositivo regimental tem sido largamente aplicado
na Seção de Direito Privado deste E. Tribunal de Justiça de São Paulo, seja para evitar inútil repetição, seja para cumprir o princípio constitucional da razoável duração dos processos (por todos, confiram-se 1006328-65.2020.8.26.0506, Rel. Des. Marrey Uint, j. 21/01/2022; 1006348-59.2020.8.26.0020, Rel. Des. Luis Carlos de Barros, j. 17/12/2021; 1001467-82.2016.8.26.0439, Rel. Des. Renato Delbianco, j. 11/08/2017; 0001597-75.2012.8.26.0004, Rel. Des. Marcos Gozzo, j. 09/08/2017).
O Colendo Superior Tribunal de Justiça prestigia esta exegese ao reconhecer "a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre omissão ou ausência de fundamentação no 'decisum'" (cf. REsp. 662.272- RS, 2a T., rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 4-9-2007; REsp. 641.963-ES, 2a T., rel. Min. Castro Meira, j. em 21-11-2005; REsp. 592.092-AL, 2a T., Rel. Min. Eliana Calmon, j. em 17-12-2004 e REsp 265.534-DF, 4a T., Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. em 01-12-2003).
Com efeito, ao afastar as preliminares apresentadas na contestação, a r. sentença vergastada acertadamente declarou nulo o casamento celebrado entre as partes.
Em que pese o matrimônio tenha sido realizado em território estrangeiro, e perante autoridade consular igualmente estrangeira, sua efetiva transcrição foi levada ao RCPN e de Interdições e Tutelas do 1º Subdistrito Sé, produzindo assim, seus regulares e jurídicos efeitos em território nacional, tal como preceitua o artigo 32, § 1º, da Lei nº 6.015/1973. De se observar, igualmente, que o apelante possui Registro Civil Brasileiro (fls. 35), sujeito, pois, in casu . à jurisdição nacional (artigos 21, e 23, III, do Código de Processo Civil). Compete à justiça brasileira, portanto, a análise do feito sub judice .
No mérito, melhor sorte não assiste ao recorrente.
Da detida análise do todo, vislumbro que as partes se casaram aos 21/10/2013 (fls. 95/96). Não obstante, há nos autos prova incontestável de que o recorrente já se encontrava casado desde 26/08/2011, com Karla Fernanda do Prado (fls. 32 e 537), sendo que estes se divorciaram tão somente aos 02/02/2015, tal como se lê na escritura pública de divórcio consensual de fls. 535/536.
Assim, o apelante, ao celebrar matrimônio com a apelada,
encontrava-se casado, e portanto, impedido de celebrar novo casamento, nos moldes do artigo 1.521, inciso VI, do CC. Por conseguinte, nulo o matrimônio contraído, fulminado que está pelo artigo 1.548, inciso II, do CC.
Consonaste afirma Maria Berenice Dias: "(...) A incapacidade para o casamento pode ser absoluta ou relativa. Absoluta - É a inaptidão genérica frente a qualquer pessoa, que não pode ser suprida pelo juiz. Alguém que não pode casar com quem quer que seja. As pessoas casadas não podem casar com ninguém. O casamento é nulo e deve ser desconstituído 1 (...)".
Despicienda portanto, a alegação de que a apelada possuía conhecimento acerca da separação de fato do recorrente, visto que impossível se convalidar infração à norma de ordem pública; como sabido, a mera separação de fato não extingue a sociedade ou o vínculo conjugal, ex vi do artigo 1.571, do CC.
Remeto os autos à D. PGJ para apuração de eventual crime de bigamia, previsto no artigo 235, do CP.
Isto posto, nego provimento ao apelo, nos termos da fundamentação supra, majorando a verba sucumbencial para 11% sobre o valor atribuído à causa.
ANA ZOMERRelatora