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- 2º Grau
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Inteiro Teor
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2016.0000416184
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº
0001434-11.2013.8.26.0247, da Comarca de São Sebastião, em que é apelante BANCO
BRADESCO S/A, é apelado SANDRA REGINA BAPTISTA DO VALE (JUSTIÇA
GRATUITA).
ACORDAM, em 15ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de
São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores COELHO
MENDES (Presidente) e JOSÉ WAGNER DE OLIVEIRA MELATTO PEIXOTO.
São Paulo, 14 de junho de 2016.
DENISE ANDRÉA MARTINS RETAMERO
RELATORA
Assinatura Eletrônica
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15ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
VOTO Nº 5041
APELAÇÃO Nº 001434-11.2013.8.26.0147
COMARCA: SÃO SEBASTIÃO
APELANTE: BANCO BRADESCO S/A
APELADO: SANDRA REGINA BAPTISTA DO VALE (JUSTIÇA GRATUITA)
JUIZ PROLATOR: CARLOS EDUARDO MENDES
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS
EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS - Funcionária pública municipal - Descontos das parcelas em folha de pagamento - Limitação dos descontos a 30% dos vencimentos líquidos da Autora -Admissibilidade-Situação que procura preservar a dignidade da pessoa, dada a natureza alimentar dos vencimentos em consonância com o princípio da razoabilidade Inteligência do art. 2º, § 2º, I, da Lei10.820/2003 e Decreto Estadual nº 60.435/2014, art. 2º, § 1º, 5) Jurisprudência do STJ e desta Colenda 15ª Câmara de Direito Privado - Sentença mantida - Recurso não provido.
VISTOS.
Trata-se de Recurso de Apelação
interposto contra r. sentença, cujo relatório se adota, que julgou
procedente em parte a ação revisional cumulada com danos morais
para condenar o réu em obrigação de não fazer consistente em absterse de realizar descontos que superem a 30% dos rendimentos da
autora.
A R sentença condenou o réu ao
pagamento das custas, despesas processuais e honorários
advocatícios fixados em R$ 800,00.
Recorre o banco defendendo a
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regularidade da contratação, com prévio conhecimento pela autora das cláusulas do contrato e da parcela que assumia, além do fato de existir, naquele momento, margem consignável disponível para permitir a concretização do mútuo.
Alega que à época da celebração do contrato as parcelas não superavam a margem de 30% dos vencimentos da autora.
Assevera que a autora é pessoa capaz, que contratou de forma livre e que deve honrar o pacto, em respeito ao Princípio do pacta sunt servanda.
Salienta que a consignação representa uma garantia à instituição financeira que disponibiliza o capital mediante a incidência de juros menores.
Pugna pelo provimento do recurso para que a ação seja julgada improcedente.
Não houve contrarrazões.
É o relatório.
De partida, ressalto que o presente Recurso foi interposto sob a égide do Código de Processo Civil/1973 e com base nele será analisado.
O recurso não comporta provimento.
É dos autos que a autora contraiu empréstimos consignados com descontos em folha de pagamento, sendo um junto à Caixa Econômica Federal com o valor dividido em 96 parcelas de R$1.183,69, um junto à Cooperativa de crédito
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Cressem com valor dividido em 16 parcelas de R$98,82 e um junto
ao apelante com o valor dividido em 96 parcelas de R$195,37.
Ocorre que em janeiro de 2013, a autora
sofreu uma abrupta redução no seu salário em virtude da cessação de
uma gratificação que recebia a título de acúmulo de função, razão
pela qual, propôs a presente ação objetivando a limitação dos
descontos efetivados pelo réu ao percentual máximo de 30% de seus
vencimentos, a qual foi julgada procedente em parte.
E com razão o Magistrado sentenciante.
A cláusula que prevê o desconto de parcela
diretamente no benefício é considerada lícita, pois foi livremente
ajustada e serve de expediente facilitador da satisfação do crédito.
Neste sentido a jurisprudência do STJ:
“Não é abusiva a cláusula inserida no contrato de empréstimo bancário que versa autorização para o banco debitar na conta corrente ou resgatar de aplicação em nome do contratante e/ou coobrigado valor suficiente ofender o princípio da autonomia da vontade, que norteia a liberdade de contratar, seja por não atingir o equilíbrio contratual ou a boa-fé, uma vez que a cláusula se traduz em mero expediente para facilitar a satisfação do crédito, seja, ainda, por não revelar ônus para o consumidor (STJ, REsp 258103/MG, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 20/03/2003).
Contudo, embora legítima tal pactuação,
diante da nova realidade financeira da devedora há de ser limitado o
percentual dos descontos a fim de garantir a subsistência dela e de
sua família.
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A retenção do salário em parte expressiva,
ou em sua integralidade viola o princípio constitucional da dignidade
humana porque obsta a satisfação das necessidades básicas do
devedor.
Ao devedor deve ser garantido primeiro o
direito de sobreviver, para posteriormente reunir condições de pagar
sua dívida.
Assim, diante desta situação, o STJ
consolidou o entendimento de que, considerando a natureza
alimentar do salário e o princípio da razoabilidade, os empréstimos
com desconto em folha de pagamento ou débito em conta corrente,
devem limitar-se a 30% do salário líquido do mutuário. Nesse
sentido, colaciona-se entendimento do E. Superior Tribunal de
Justiça:
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 128 E 460 DO CPC -INEXISTÊNCIA. DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. LIMITAÇÃO DO DESCONTO EM 30%. PRECEDENTES. DECISÃO
AGRAVADA CONFIRMADA.
IMPROVIMENTO. 1.- Não importa em julgamento extra petita e, por conseguinte, não há ofensa ao disposto nos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil, o julgamento da causa em conformidade com o que foi proposta. 2.- Tem prevalecido nas Turmas que integram a C. Segunda Seção o entendimento de que, ante a natureza alimentar do salário e do princípio da razoabilidade, os empréstimos com desconto em folha de pagamento devem limitar-se a 30% da remuneração. 3.- O agravante não trouxe nenhum argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por
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seus próprios fundamentos. 4.- Agravo Regimental improvido.” ( AgRg no AREsp 490869 / RJ, Terceira Turma, Rel. Ministro Sidnei Beneti, DJe 22/05/2014, v.u.)
No mesmo seguimento, esta Colenda
Câmara de Direito Privado preleciona:
“CONTRATOS BANCÁRIOS -Empréstimos consignados - Ação ordinária -Limitação de descontos sobre os vencimentos líquidos - Sentença de parcial procedência -Débitos efetuados em folha de pagamento -Necessidade de preservação da dignidade da pessoa humana e da proteção ao salário ( CF, artigos 1º, III, E 7º, IV)- Limite de 30% regular - Aplicação, por analogia, das regras contidas na lei 10.820/03 - Prorrogação do número de parcelas até liquidação final, e com incidência dos encargos ajustados - Limitação de descontos que obsta seja o mutuário considerado em mora e o contrato rescindido -Acolhimento do pedido de abstenção, a qual não obsta exercício regular de direito pelo credor de tirar eventual protesto, promover inscrição em órgãos de proteção ao crédito ou cobrança da dívida, e considerar rescindido o contrato em caso de ulterior falta de pagamento de parcelas pelo novo valor - Sentença modificada em parte - Recurso provido.(Relator (a): José Wagner de Oliveira Melatto Peixoto; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 25/02/2016; Data de registro: 25/02/2016)
Com isso, se procura preservar a dignidade
da pessoa.
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2º, I, da Lei 10.820/2003 e 45, parágrafo único, da Lei 8.112/90, a soma dos descontos em folha de pagamento de prestações de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil não poderá exceder a 30% da remuneração do empregado regido pela CLT.
E não é outra a margem consignável estipulada pelo Decreto Estadual nº 60.435/2014, que revogou o Decreto Estadual nº 51.314/06 de modo a limitar as consignações em folha de pagamento relativas aos funcionários públicos civis e militares, ativos, inativos e reformados e de pensionistas da administração direta e autárquica a 30 % dos vencimentos líquidos (art. 2º, § 1º, 5).
Portanto, a limitação em 30%, é a adequada ao caso.
Ressalte-se que nada impede essa revisão contratual, tendo em vista a relação consumerista estabelecida entre as partes , possibilita a relativização do princípio “pacta sunt servanda”
E na espécie, os demonstrativos de pagamento de fls. 21/23 demonstram que a autora percebeu, a titulo de rendimentos líquidos a quantia de R$ 2.017,06 e teve descontos referentes a todos os empréstimos consignados no valor de R$1.508,55.
De fato, a soma dos descontos supera os 30% dos vencimentos líquidos da autora, percentual que, evidentemente, fere a razoabilidade, frente a natureza alimentar dos vencimentos.
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Assim, era mesmo caso de limitar os descontos das parcelas a 30% dos vencimentos líquidos da autora.
Por fim, diante do decidido acima, deixo
de aplica as Jurisprudências citadas a fls.125 v.
Posto isto, pelo meu voto nego provimento ao recurso.
DENISE ANDRÉA MARTINS RETAMERO
Relatora