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Inteiro Teor
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2019.0000257870
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº
1020770-82.2015.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos, em que é apelante LUIZ
ANTONIO DA SILVA PINTO (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado RÁDIO E
TELEVISÃO BANDEIRANTES S/A.
ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de
Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso, V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores
VITO GUGLIELMI (Presidente sem voto), JOSÉ ROBERTO FURQUIM
CABELLA E ANA MARIA BALDY.
São Paulo, 4 de abril de 2019.
RODOLFO PELLIZARI
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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Apelação Cível - digital
Processo nº 1020770-82.2015.8.26.0224
Comarca: 10ª Vara Cível de Guarulhos - SP
Magistrada: Dra. Rossana Luiza Mazzoni de Faria
Apelante: Luiz Antonio da Silva Pinto
Apelada: Rede Bandeirantes de Televisão S.A.
Voto: 00356M
APELAÇÃO. Responsabilidade civil. Ação indenizatória por dano moral. Autor que alega ter violado seu direito de imagem pela ré e ofensa à honra, em razão de veiculação por mídia televisiva de uma matéria que relatava a discussão do autor com sua esposa, que gerou demissão do emprego. Reportagem transmitida em três datas diferentes. Direito ao esquecimento e indenização por dano moral. Sentença de parcial procedência. Determinação à ré de que cesse a transmissão da imagem do autor e o fato que gerou a reportagem, sob pena de multa de R$ 500.000,00. Inconformismo. Pretensão ao reconhecimento do dano moral e fixação da verba indenizatória. Afastamento. A violência contra a mulher é de relevância social e a matéria possui cunho informativo. Dano moral afastado, garantido o direito ao esquecimento. Exegese dos artigos 15 e 16, Lei 13.709/2018. Sentença mantida. RECURSO NÃO PROVIDO.
Trata-se de recurso de apelação
interposto contra a r. sentença de fls. 223/227, proferida nos
autos da Ação Indenizatória, que julgou PARCIALMENTE
PROCEDENTE o pedido inicial, para condenar a ré se abster de
novamente veicular a matéria discutida por meio destes autos,
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para que seja garantido ao autor o direito ao esquecimento dos fatos ilícitos outrora praticados, sob pena de incidência de multa de R$ 500.000,00. Reconhecida a sucumbência recíproca, fixada a verba honorária em 10% sobre o valor da causa devido a cada patrono.
Insurge-se o autor, pela reforma da r. sentença, aduzindo que teve sua imagem e honra maculadas pela ré, quando esta transmitiu pela mídia televisiva, reiteradas vezes, matéria com o título “Ciúme de homem pobre”, que relatava a discussão acalorada que o autor teve com sua esposa, circunstância que gerou ocorrência policial. O autor afirma que foi demitido do emprego em razão da grande repercussão negativa da referida matéria.
Recurso recebido e processado, os autos
subiram com oferta de contrarrazões (fls. 258/272).
Há oposição ao julgamento virtual (fls. 290).
É o relatório.
A r. sentença é irretorquível.
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Cinge-se a controvérsia na legitimidade do pedido de indenização por de dano moral, eventualmente suportado pelo autor, decorrente de matéria jornalística veiculada reiteradas vezes pela ré, em seu canal televisivo, que relatava a discussão acalorada entre o autor e sua esposa, na data de 21/05/2014, circunstância que gerou intervenção policial e demissão do autor do emprego.
Pois bem.
Ab initio, o inciso I, do artigo 15, da Lei 13.709/2018, que trata da utilidade à informação, dispõe que:
“Art. 15. O término do tratamento de
dados pessoais ocorrerá nas seguintes hipóteses:
I. verificação de que a finalidade foi
alcançada ou de que os dados deixaram de ser necessários ou pertinentes ao alcance da finalidade específica almejada.
No mesmo propósito, o artigo 16 da citada norma, define:
“Art. 16. Os dados pessoais serão
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eliminados após o término de seu tratamento, no âmbito e nos limites técnicos das atividades, autorizada a conservação para as seguintes finalidades:
I. cumprimento de obrigação legal ou
regulatória pelo controlador;
II. estudo, por órgão de pesquisa,
garantida, sempre que possível, a anonimização dos dados pessoais [...]”.
Destarte, ainda que o autor tenha direito ao esquecimento, tutelado pela Lei 13.709/2018, notadamente em seus artigos 15 e 16, referente aos fatos que envolviam a discussão com sua esposa, veiculados na mídia, é certo que o fato é real e constitui um ilícito civil, que não foi contestado pelo autor, circunstância que, por si só, afasta o dano moral indenizável.
Nesse aspecto, a questão relata o tema da violência contra a mulher, que tem sido muito disseminado ultimamente, e serve de informativo à população. Trata-se, portanto, de matéria jornalística.
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Anoto que o Código de Ética dos Jornalistas, aprovado pela Federação Nacional dos Jornalistas, expressa acerca da cautela que se deve ter por tais profissionais no exercício da função:
“divulgação de informação precisa e correta” (artigo 2º), bem como que a informação divulgada “se pautará pela real ocorrência dos fatos e terá por finalidade o interesse social e coletivo” (artigo 3º).
Na lição de Alexandre de Morais, depreende-se que:
“A liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e compreende não somente as informações consideradas como inofensivas, indiferentes ou favoráveis, mas também as que possam causar transtornos, resistência, inquietar pessoas, pois a democracia somente existe baseada na consagração do pluralismo de ideias e pensamentos, da tolerância de opiniões e do espírito aberto ao diálogo 1 ”.
1 Constituição do Brasil interpretada e Legislação Constitucional. 7ªedição, Atlas, 2007, p. 141
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No mesmo passo, Edilson Pereira de Farias preceitua:
“A liberdade de expressão e informação, que atinge o nível máximo de sua proteção quando exercida por profissionais dos meios de comunicação social, como qualquer outro direito fundamental, não é absoluta, tem limites. Assim, além do limite interno referido da veracidade da informação, a liberdade de expressão e informação deve compatibilizar-se com os direitos fundamentais dos cidadãos afetados pelas opiniões e informações, bem como ainda com outros bens constitucionalmente protegidos, tais como a moralidade pública, saúde pública, segurança pública, integridade territorial, etc 2 .”
Em casos análogos ao dos autos, este Egrégio Tribunal de Justiça decidiu:
DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. Ação de indenização por danos morais. 2 FABRIS, Sergio Antonio. “Colisão de Direitos A Honra, a Intimidade, a Vida Privada e a Imagem versus A Liberdade de Expressão e Informação”, 2ª ed., 2000, pp. 168-169
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Reportagem veiculada pela Rede Record, no programa “Cidade Alerta”, supostamente ofensiva ao autor. Matéria que narra denúncias da ex-companheira de atos de violência doméstica e subtração de incapaz. Apenas fatos verdadeiros, de interesse público e de narrativa pertinente têm o condão de afastar a ilicitude da matéria jornalística e caracterizar exercício da liberdade de imprensa. Inviável reconhecer a procedência do pedido em relação a quem veicula a notícia jornalística e, na mesma decisão, determinar que a parte denunciante informe os andamentos dos processos cíveis e criminais envolvendo o casal. Precipitado o julgamento parcial de mérito, antes mesmo da vinda aos autos de documentos que traduzem valioso elemento de cognição acerca da veracidade dos fatos. Decisão anulada, para determinar que o pedido indenizatório seja enfrentado por sentença que deverá analisar conjuntamente a responsabilidade de ambas as partes. Recurso provido em parte. (Agravo de
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Instrumento 2015188-38.2019.8.26.0000. 1ª Câmara de Direito Privado. Relator: Des. Francisco Loureiro. Julgado em 08/03/2019);
Apelação. Ação Indenizatória. Responsabilidade Civil. Abuso de direito. Inocorrência. Analisando as reportagens exibidas, observo que não se referem ao apelante, tampouco há vinculação direta à sua imagem. Presença exclusiva do animus narrandi. Dano moral não configurado. Sentença de improcedência mantida. SUCUMBÊNCIA. Majoração dos honorários advocatícios, segundo as disposições do art. 85, § 11, do CPC/2015. RECURSO NÃO PROVIDO. (Apelação nº 1032153-34.2016.8.26.0576. 2ª Câmara de Direito Privado. Relator: Álvaro Passos. Julgado em 23/11/2017).
Destarte, não verifico excesso na conduta da ré até o presente momento.
Por outro lado, agiu com acerto o Douto Juízo singular ao fixar multa à ré no caso de veicular, pela quarta
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vez, a referida matéria, pois embora se considere o direito à informação e a liberdade de expressão da ré, deve ser respeitada a imagem do autor, a fim de que este não venha a suportar o dano em sua vida, na esfera civil.
Ora, se de um lado a Constituição Federal assegura a liberdade de expressão, consoante se extrai do § 1º do art. 220, que determina seja observado o contido no inciso X do art. 5º, de outro há que se respeitar as limitações, consubstanciadas na cautela à exposição de juízos de valores sobre fatos ou casos, e a fim de que não seja gerado dano moral ao autor, o Douto Juízo fixou a multa de R$ 500.00,00 em caso de reiteração da veiculação da matéria, resolvendo a lide.
Diante de tal panorama, impossível infirmar a decisão recorrida.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO ao recurso para manter a r. sentença integralmente, afastando os encargos cobrados pela associação, com majoração da verba honorária recursal para 15% sobre o valor atribuído à causa, em favor do patrono da ré, observada a gratuidade de justiça, nos termos do artigo 85, § 11, do CPC.
RODOLFO PELLIZARI
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