3 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2019.0000416109
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1042601-68.2018.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante BRADESCO SAÚDE S/A, é apelada MARIA LÚCIA LORENZO RIVERA.
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores MAIA DA CUNHA (Presidente sem voto), MAURÍCIO CAMPOS DA SILVA VELHO E ENIO ZULIANI.
São Paulo, 29 de maio de 2019.
Alcides Leopoldo
Relator
Assinatura Eletrônica
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APELAÇÃO CÍVEL
Processo n. 1042601-68.2018.8.26.0100
Comarca: São Paulo (36ª Vara Cível Central)
Apelante: Bradesco Saúde S/A
Apelada: Maria Lúcia Lorenzo Rivera
Juíza: Paula da Rocha e Silva Formoso
Voto n. 16.275
EMENTA: SEGURO SAÚDE Morte do titular Cláusula contratual abusiva - Direito da dependente de manutenção do contrato nas mesmas condições Inteligência do art. 51, IV, CDC e dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da proteção da segurança jurídica Independentemente da separação de fato e da união estável, relevante é que, mantiveramse casados, e o titular do plano preservou a autora como beneficiária do plano, não a substituindo pela companheira, de maneira que foram resguardados seus direitos de remissão e à continuidade do vínculo contratual - Procedência da ação Recurso desprovido.
Trata-se de ação declaratória c.c. obrigação de fazer,
alegando a autora, com 80 anos de idade, que seu falecido marido era titular
de seguro saúde familiar mantido pela ré de 1973, do qual é dependente, e
após o óbito foi informada que não teria mais direito ao referido seguro
saúde, por constar da Certidão de Óbito que ele vivia em concubinato com
outra mulher, o que não altera seu direito, pois permanecia juridicamente
casada, em razão do que, invocando a nulidade da cláusula restritiva, pleiteia
a continuidade do contrato existente, e após o período de remissão, a emissão
dos boletos.
A r. sentença, cujo relatório se adota, julgou procedente a
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ação, condenando a requerida em manter o plano de saúde da autora, após o período do benefício de remissão pelo prazo de cinco anos, nas mesmas condições pactuadas originalmente, mediante o pagamento da contraprestação correspondente, acrescido dos reajustes aprovados pela ANS para os contratos individuais, confirmando a tutela antecipada, arcando ainda a ré com o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor da causa (fls. 132/136).
A requerida apelou arguindo que não se aplica à apelada o benefício da remissão, pois o falecido titular da apólice convivia em união estável com outra mulher, não existindo, portanto, relação de dependência entre o falecido e a autora, que é inelegível para o benefício, sendo ainda impossível à ré oferecer nova apólice individual à apelada, pois desde 2007 não comercializa planos individuais, inexistindo na lei regra que obrigue a seguradora a manter vigente o contrato de seguro saúde “ad infinitum” após a morte do titular, sendo a cláusula de remissão um benefício contratual ofertado e deve ser cumprida como estipulado, sujeitando-se as partes aos princípios contratuais, requerendo a reforma para que seja julgada improcedente a ação (fls. 139/156).
Foram apresentadas contrarrazões, sustentando-se a manutenção da decisão (fls. 162/186).
É o Relatório.
A autora pretende ser mantida no plano de saúde nas mesmas condições de quando era dependente de seu marido Luiz Lorenzo Rivera (fls. 27), falecido em 10/10/2017 (fls. 30), diante da rescisão do contrato após gozar do benefício por mais de 40 anos.
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se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde", ainda que não adaptados à Lei n. 9.656/98.
Colhe-se da lição de Maria Stella Gregori 1 que:"a relação jurídica de consumo nos serviços de assistência à saúde entre o consumidor, que é o titular de planos de saúde, os seus dependentes, os agregados, os beneficiários, os usuários, ou seja, todos os que utilizem ou adquirem os serviços de saúde como destinatários finais ou equiparados, e o fornecedor, que pode ser operadora de planos de assistência à saúde, hospitais, clínicas, laboratórios ou médicos, todos aqueles que prestam serviços de assistência à saúde, no mercado de consumo, está amparada pelo CDC".
Como salienta Cláudia Lima Marques 2 , em matéria de plano de saúde, impõe-se à fornecedora os"deveres de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado).
Com o falecimento do titular, estando consolidado longo relacionamento contratual desde 1973, há direito da beneficiária à continuidade da prestação dos mesmos serviços, ainda que assumindo outra posição contratual. Há que se conferir proteção adequada nos contratos relacionais. Consoante o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "os contratos de seguro e assistência à saúde são pactos de cooperação e solidariedade, cativos e de longa duração, informados pelos princípios consumeristas da boa-fé objetiva e função social, tendo o objetivo precípuo de assegurar ao consumidor, no que tange aos riscos inerentes à saúde, tratamento e segurança para amparo necessário de seu parceiro contratual" ( REsp 962.980/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
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TURMA, julgado em 13/03/2012, DJe 15/05/2012).
Como bem observado pela I. Magistrada sentenciante, não obstante o titular, Sr. Luís, e a requerente estivessem separados de fato quando do óbito, pois vivia em união estável com outra mulher, é certo que nunca se divorciaram, de forma que o vínculo matrimonial não se desfez e, para efeitos legais, a autora não deixou de ser cônjuge. Além disso, a requerente sempre utilizou o plano de saúde, tendo todas as suas mensalidades sido devidamente quitadas (fls. 51/54), de modo que a relação de dependência entre eles restou suficientemente comprovada.
Independentemente da separação de fato e da união estável, relevante é que, mantiveram-se casados, e o titular do plano preservou a autora como beneficiária do plano, não a substituindo pela companheira, de maneira que foram resguardados seus direitos de remissão e à continuidade do vínculo contratual.
Aplica-se por equiparação o entendimento do art. 3º, § 1º, da RN 195/2009 da ANS, no sentido de que “a extinção do vínculo do titular do plano familiar não extingue o contrato, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes” e da Súmula Normativa n. 13 da ANS, a qual dispõe que: "o término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo".
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É abusiva, e consequentemente nula (art. 51, IV, CDC), a negativa de manutenção do contrato nas mesmas condições nas quais a autora figurava como dependente, exigindo celebração de nova avença, submetendo os beneficiários a nova carência, valores e índices de reajustes.
Devem ser observados os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da proteção da segurança jurídica, sendo assegurada a manutenção das mesmas condições contratuais, em relação à beneficiária, que passa a assumir a titularidade com o pagamento das mensalidades.
Consoante o entendimento do STJ: "o término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo (Súmula Normativa nº 13/2010 da ANS)" ( AgInt no AREsp 771.016/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/03/2017, DJe 16/03/2017).
Em casos similares, assim já decidiu esta C. Corte:
2026531-02.2017.8.26.0000 Agravo de Instrumento / Planos de Saúde
Relator (a): Christine Santini
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito
Privado
Data do julgamento: 31/05/2017
Data de registro: 31/05/2017
Ementa: Agravo de Instrumento. Plano de saúde Decisão que deferiu tutela de
urgência para manutenção da agravada como beneficiária de plano de saúde após
o óbito do titular Configuração do pressuposto da probabilidade do direito
Apelação Cível nº 1042601-68.2018.8.26.0100 -Voto nº 16.275 6
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Falecimento do titular do plano de saúde que, em tese, não acarreta a extinção de plano do contrato Agravada que consta como dependente do plano há mais de trinta anos Razoável a assunção da qualidade de titular com o óbito do antigo titular da apólice na forma da R. Decisão agravada. Nega-se provimento ao recurso
0004058-58.2013.8.26.0368 Apelação / Planos de Saúde
Relator (a): Christine Santini
Comarca: Monte Alto
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito
Privado
Data do julgamento: 08/09/2015
Data de registro: 09/09/2015
Ementa: Apelação Cível. Plano de saúde Rescisão unilateral do contrato por morte da titular Irrelevância da modalidade de contratação do plano (familiar, coletivo empresarial ou coletivo por adesão) Inteligência do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor Óbito da titular que não encerra a relação obrigacional, podendo os beneficiários optar pela permanência no contrato, com as mesmas cláusulas e condições vigentes Normas administrativas da ANS que não podem estabelecer restrições não previstas em lei Dano moral não configurado Mero aborrecimento que não é suficiente para caracterizar dano moral Reforma da R. Sentença para afastar a indenização por danos morais Litigância de má-fé dos autores não caracterizada. Dáse provimento em parte ao recurso.
0182467-21.2012.8.26.0100 Apelação / Planos de Saúde
Relator (a): Rui Cascaldi
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito
Privado
Data do julgamento: 01/09/2015
Data de registro: 02/09/2015
Ementa: SEGURO-SAÚDE Morte do titular Legitimidade passiva tanto da administradora quanto da seguradora Responsabilidade solidária desta pelos atos da preposta - Autora, esposa do falecido, que pretende manter a apólice nas mesmas condições, depois de findo o período de remissão Possibilidade Cláusula que não prevê, de forma expressa, a rescisão do contrato, permitindo dupla interpretação
Exegese mais favorável ao consumidor Alteração de titularidade do seguro determinada, nas mesmas condições contratuais Continuidade de vigência da apólice que deve se dar por prazo indeterminado Precedente Dano moral Não configurado
Ausência de abalo relevante a direito de personalidade da autora Recurso da seguradora ré e da autora parcialmente providos
1009531-75.2014.8.26.0011 Apelação / Planos de Saúde
Relator (a): Claudio Godoy
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito
Privado
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Data do julgamento: 10/03/2015
Data de registro: 12/03/2015
Ementa: Seguro saúde. Falecimento do titular, com cláusula de remissão em favor da
beneficiária. Período respectivo de três anos gozado pela autora. Denúncia unilateral do
contrato pela seguradora. Imposição de nova. Abusividade. Manutenção do contrato,
com a autora como beneficiária, que é de rigor. Sentença reformada. Recurso provido.
Assim, de rigor a manutenção da sentença, pelos seus
judiciosos fundamentos.
Pelo exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso
majorando-se a verba honorária, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, para
20% do valor atualizado da causa.
Alcides Leopoldo
Relator
Assinatura Eletrônica