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- 2º Grau
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Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
35.ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Registro: 2016.0000049666
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n.º 0057647-24.2008.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante AUTO POSTO CASTELO CAMPINAS LTDA, são apelados JOKOB HERSZ KILBURD e ANA SARAH KILBURD,
ACORDAM , em 35ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso, com observação. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ARTUR MARQUES (Presidente sem voto), MORAIS PUCCI E FLAVIO ABRAMOVICI.
São Paulo, 1 de fevereiro de 2016.
Gilberto Leme
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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35ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Apelação com revisão n.º 0057647-24.2008.8.26.0114
Comarca: Campinas
Apelante: Auto Posto Castelo Campinas Ltda.
Apelados: Jakob Hersz Kilburd;
Ana Sarah kilburd;
Juíza sentenciante: Jovanessa Ribeiro Silva Azevedo Pinto
LOCAÇÃO DE IMÓVEL NÃO RESIDENCIAL. AÇÃO RENOVATÓRIA. CONTRATO PRORROGADO POR TEMPO INDETERMINADO. FALTA DE PRESSUPOSTO PROCESSUAL. PERDA DO FUNDO DE COMÉRCIO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. RENÚNCIA AO DIREITO DE RETENÇÃO OU INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS. CLÁUSULA VÁLIDA. NOTIFICAÇÃO ENCAMINHADA AO LOCATÁRIO CONCEDENDO PRAZO PARA DESOCUPAÇÃO EM TRINTA DIAS. ÚNICO REQUISITO PARA A DENÚNCIA DE LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL POR PRAZO INDETERMINADO. Na locação não-residencial, terá direito à renovação, por igual prazo, as locações ajustadas por meio de contrato escrito com prazo determinado. Prorrogado o contrato por prazo indeterminado, é incabível o pleito renovatório. Ausência de preenchimento dos requisitos do art. 51 da Lei 8.245/91. Extinção do processo sem resolução do mérito por falta de pressuposto processual (art. 267, inciso IV, do CPC). Ausente o direito de renovação da locação, o locatário não tem direito a qualquer indenização, por parte do locador, pela mera perda do fundo de comércio. Cláusula contratual no sentido de que todas e quaisquer benfeitorias realizadas pelo locatário incorporam-se ao imóvel alugado, sendo clara a renúncia ao direito de indenização ou retenção. Súmula 335 do STJ. Nos termos do art. 57 da Lei 8.245/91, a locação não residencial por prazo indeterminado pode ser denunciada por escrito, concedido o prazo de trinta dias para desocupação, não importando que, meses antes, as partes tenham ajustado
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novo aluguel. Recurso desprovido, com observação.
VOTO N.º 14.977
Trata-se de recurso de apelação interposto à r. sentença de fls. 324/327v.º que julgou procedente a pretensão inicial para declarar rescindido o contrato e, por consequência, decretar o despejo do réu, fixado o prazo de 30 dias para desocupação voluntária. A r. sentença recorrida extinguiu o processo relativo à ação renovatória por falta de interesse de agir, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC. Em razão da sucumbência, o réu foi condenado a arcar com o pagamento das custas, das despesas processuais e dos honorários advocatícios, que foram fixados em 15% do valor atualizado de cada uma das ações.
Apela o réu da ação de despejo e autor da ação renovatória, Auto Posto Castelo Campinas Ltda., alegando que a locação foi contratada com cláusula de renovação automática por igual período, pelo que não se há de falar em prorrogação por prazo indeterminado, mas, sim, de prorrogação por igual período. Aduz que o art. 51, ao estabelecer que a contratação tem que ser por escrito, não estabeleceu que tenha que ser renovada a cada período prorrogado. Acrescenta ainda que houve grande investimento no local com substituição de todos os equipamentos e de toda a tubulação, o que enseja, ao menos, direito de receber indenização pelos investimentos corpóreos e incorpóreos, que gira em torno de R$ 2.500.000,00.
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Argumenta também que os apelados agiram de má-fé, tendo em vista que enviaram notificação para a desocupação do imóvel em julho de 2008, sendo que em fevereiro do mesmo ano haviam firmado acordo com a apelante fixando novo aluguel.
Recurso tempestivo, preparado e respondido.
É o relatório.
Tratando-se de imóvel locado para fins comerciais, a Lei n.º 8.245/91 assegura a permanência do locatário no imóvel com renovações sucessivas do contrato, visando à proteção do fundo de comércio. Mas, para tanto, é necessário que o locatário atenda a certos requisitos previstos no artigo 51 que prescreve:
“Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:
I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;
II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos;
III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.”
“O primeiro requisito explicava FRANCISCO CARLOS ROCHA DE BARROS impõe que o contrato a renovar 'tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado'. A norma é simples e de entendimento fácil, excluindo da proteção da lei qualquer locação que não tenha sido ajustada pela forma aqui reclamada. A locação verbal ou a locação escrita, mas sem tempo determinado de duração,
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não são acolhidas pelo artigo.” (Comentários à Lei do Inquilinato, pág. 246, Saraiva, 1995)
No caso em julgamento, as partes firmaram o contrato de locação de imóvel não residencial por escrito com prazo determinado de 4 (quatro) anos e 4 (quatro) meses, pelo período de 1.9.1977 a 31.12.1981, tendo sido consignado que a locação poderia ser prorrogada “por iguais períodos de comum acordo entre as partes” (cláusula segunda fl. 33).
Note-se que as partes não divergem acerca do fato de que, decorrido o prazo determinado inicialmente, não foi firmado nenhum outro contrato por escrito, embora a locação tenha perdurado até julho de 2008 sem qualquer objeção dos locadores, que somente notificaram o locatário acerca de sua intenção de retomar o imóvel em 31.7.2008.
Porém, da leitura da disposição contratual, denota-se que, ao término do prazo determinado em 31.12.1981, as partes renovariam o contrato se assim tivessem de acordo. No entanto, decorrido tal prazo, não houve nenhuma manifestação expressa de vontade das partes no sentido de que o contrato se prorrogaria por mais quatro anos e quatro meses, pelo que não se pode considerar que houve a prorrogação do contrato por prazo determinado.
O que se infere no caso é que houve prorrogação da locação, mas nos termos do parágrafo único do art. 56 da Lei 8.245/91: “Findo o prazo estipulado, se o locatário permanecer no imóvel por mais de trinta dias, sem
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oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a locação nas condições ajustadas, mas sem prazo determinado.”
Aliás, mesmo que se considere que houve prorrogação por período certo e não indeterminado, tal se deu por meio verbal, o que não admite direito à renovação da locação pelo locatário, conforme preceitua o aludido art. 51 da Lei 8.245/91. Frise-se que a simples existência de cláusula contratual prevendo a possibilidade de eventual prorrogação não enseja a conclusão de que as prorrogações foram feitas por escrito.
Assim, concluindo-se que na realidade houve a prorrogação do contrato por prazo indeterminado, falta ao locatário o preenchimento dos requisitos para a propositura da ação renovatória compulsória do contrato de locação.
Esse é o entendimento consolidado por esta Corte:
“AGRAVO. LOCAÇÃO COMERCIAL. AÇÃO RENOVATÓRIA. DISCUSSÃO SOBRE CLÁUSULA DO TEMPO DO CONTRATO QUE PREVIU RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA. APRECIAÇÃO EM AÇÃO RENOVATÓRIA ANTERIOR. CLÁUSULA AUTOMÁTICA NÃO APLICÁVEL PARA NOVO PERÍODO.HIPÓTESE EM QUE A LOCAÇÃO PASSOU A VIGER POR PRAZO INDETERMINADO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR PARA NOVA AÇÃO RENOVATÓRIA AJUIZADA DEPOIS DO VENCIMENTO DO CONTRATO ESCRITO. CARÊNCIA DA AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. RECURSO PROVIDO.
Falta interesse de agir ao locatário que ajuíza ação renovatória de locação comercial após a vigência do contrato escrito e no prazo legal previsto no art. 51 da Lei n.º 8.245/91. No caso, o contrato celebrado entre as partes estipulou vigência de três anos, com prorrogação por igual prazo ou maior, se posteriormente estipulado. O locatário, então, valendo-se da prorrogação automática,
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obteve, em ação judicial, a somatória dos prazos e consequente renovação compulsória. Passados mais cinco anos, ajuizou nova ação, pretendendo fosse computada novamente a somatória do prazo original e o da prorrogação automática. Contudo, para efeito de nova ação renovatória, não é possível nova aplicação da cláusula de prorrogação automática, conforme precedente do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Saliente-se que o julgamento de anterior ação renovatória não gerou vinculação a respeito da interpretação e aplicação da cláusula contatual que dispôs sobre a duração do contrato, inexistindo coisa julgada a ser obedecida. Verifica-se que, encerrado o prazo contratual, o contrato de locação teve sua vigência convertida para prazo indeterminado, não suscetível, portanto da renovação compulsória aludida o art. 51 da Lei n.º 8.245/91.” (Agravo de instrumento n.º 2127879-34.2015.8.26.0000, Rel. Des. Adilson de Araujo, 31.ª Câmara de Direito Privado, j. 4.8.2015, v.u.)
“Ação renovatória. Contrato que previa prorrogação automática, dependente porém de expressa manifestação da vontade das partes, inexistente nos autos. Vigência prorrogada, na espécie, por tempo indeterminado, motivo pelo qual não preenchido o requisito do inciso I do artigo 51 da lei 8245/91. Renovação compulsória que se traduz em restrição ao direito de propriedade, pedindo interpretação igualmente restritiva e não ampliativa. Falta de interesse processual de agir bem reconhecida. Honorários diminuídos para R$ 10.000,00, por equidade. Apelo provido parcialmente para esse único fim.” (Apelação n.º 0198843-53.2010.8.26.0100, Rel. Des. Soares Levada, 34.ª Câmara de Direito Privado, j. 1.10.2012, v.u.)
Somente de se observar que, faltando ao
locatário-autor o preenchimento de um dos requisitos para a
propositura da ação, era caso de extinção do processo por
ausência de pressuposto processual, nos termos do art. 267,
inciso IV, do CPC.
Melhor sorte não assiste ao apelante em
relação ao pedido indenizatório pela perda do fundo de
comércio e pelas benfeitorias realizadas no imóvel.
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No caso em tela, a cláusula sétima do contrato de locação estabelece que: “O locatário fica, desde já, autorizado a fazer quaisquer benfeitorias, alterações ou acréscimos no imóvel, seus pertences, instalações e equipamentos, desde que isso contribua para melhorar a utilização do imóvel, entendido, porém, que estas benfeitorias não darão ao locatário direito de indenização ou retenção, findo ou rescindido o presente contrato, incorporando-se desde logo, ao imóvel locado, para todos os fins e feitos de direito.” (fls. 14/15).
De acordo com o art. 35 da Lei do Inquilinato, “salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis, e permitem o exercício do direito de retenção.”
Também a Súmula 335 do STJ: “Nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à indenização das benfeitorias e ao direito de retenção.”
Infere-se, portanto, que, tendo o locatário renunciado à indenização pelas benfeitorias, não se há de falar em recebimento de qualquer valor a tal título.
A mesma conclusão tem-se em relação à perda do fundo de comércio. Conforme anotado por THEOTÔNIO NEGRÃO, o que foi inclusive observado pela r. sentença recorrida, “se o locatário não tem direito à renovação do
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contrato (art. 51) ou deixou de propor, no prazo, a ação renovatória, não é devida, pelo locador que rescinde unilateralmente a locação, a indenização pela perda do fundo de comércio (STJ-RT 700/197; STJ-6.ª T., REsp 282.473, Min. Vicente Leal, j. 27.8.02, DJU 16.9.02).” (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, nota 11a ao art. 52 da Lei 8.245/91, pág. 1.557, Saraiva, 2010)
Na verdade, tal entendimento origina-se de um raciocínio lógico, pois qualquer entendimento diverso ensejaria direito de indenização ao locatário sempre que, locado imóvel para fins comerciais, tivesse que desocupálo, mesmo que não tivesse direito à renovatória, como é o caso dos autos, o que ensejaria um absurdo prejuízo aos locadores de imóveis não residenciais.
Por fim, de se consignar que, não havendo divergência entre as partes de que o locatário foi notificado por escrito para desocupar o imóvel no prazo de trinta dias, exatamente como prescreve o art. 57 da Lei 8.245/91, nenhuma irregularidade se infere somente porque alguns meses antes as partes tinham acordado novo aluguel.
Pelo meu voto, nego provimento ao recurso, com observação.
GILBERTO LEME
Relator